logo Agência Brasil
Saúde

Síndrome de Asperger: entenda por que o termo não é mais usado

Diagnóstico é enquadrado como transtorno do espectro autista (TEA)
Paula Laboissière* – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 18/02/2025 - 12:07
Brasília
Simbolo do Autismo. Foto: Ilustração/Simbolo Autismo
© Ilustração/Simbolo Autismo

Autismo leve ou autismo de alta funcionalidade são algumas expressões populares associadas à síndrome de Asperger. O que poucos sabem é que essa nomenclatura deixou de ser utilizada desde 2013, quando a maioria das pessoas com o diagnóstico foi enquadrada no transtorno do espectro autista (TEA) como autista nível 1 de e.

Brasília (DF) 18/02/2025 - Psicólogo Leandro Cunha fala sobre transtorno do espectro autista (TEA).
Foto: Leandro Cunha/Arquivo pessoal
Psicólogo Leandro Cunha explica que a síndrome de Asperger era uma condição caracterizada por dificuldades na interação social - Foto: Leandro Cunha/Arquivo pessoal

Em entrevista à Agência Brasil, o psicólogo Leandro Cunha explicou que a síndrome de Asperger era uma condição caracterizada por dificuldades na interação social, além de padrões de comportamento repetitivos e interesses s, conhecidos como hiperfocos. Distinguia-se do autismo clássico por não apresentar atraso cognitivo global e porque a comunicação verbal se fazia presente.

“Por isso, muitas vezes, Asperger era associada a termos como autismo leve ou autismo de alta funcionalidade”, destacou.

“Comportamentos antes atribuídos à síndrome ainda são observados no diagnóstico de TEA. O que mudou foi a ausência de uma separação formal, considerando que o espectro varia em intensidade e frequência de características. Isso permite uma abordagem mais flexível e individualizada”, explica.

Entenda

A síndrome de Asperger foi descrita inicialmente pelo pediatra austríaco Hans Asperger, em 1944, após observar pacientes com dificuldades de interação social. Anos depois, a condição aria a figurar como uma categoria diagnóstica distinta. Desde 2013, entretanto, a síndrome deixou de existir isoladamente e ou a integrar o escopo do TEA.

Foi por meio da quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria, que surgiu o termo transtorno do espectro autista. A publicação ou a enquadrar tanto o chamado autismo clássico como a síndrome de Asperger como uma única condição, mas com um grande espectro de características e sintomas.

Algo semelhante aconteceu com a Classificação Internacional de Doenças (CID), que contém cerca de 55 mil códigos para lesões e doenças. A CID-10, que vigorou de 1993 a 2021, classificava o autismo dentro dos transtornos globais do desenvolvimento e codificava separadamente a síndrome de Asperger. Já na CID-11, em vigor desde janeiro de 2022, Asperger deixa de existir isoladamente e a a fazer parte do TEA.

Características que antes integravam a síndrome, portanto, permanecem como padrões a serem observados ao diagnosticar uma pessoa com TEA. 

“A mudança é positiva porque reconhece o autismo como um espectro, evitando divisões rígidas que dificultavam o diagnóstico e o o ao e adequado. Além disso, promove uma visão mais inclusiva da condição”, avalia a psicóloga e psicanalista Sílvia Oliveira.

“A nova classificação reconhece o TEA como um espectro contínuo, no qual os sintomas variam em intensidade e impacto na vida do indivíduo, sem barreiras artificiais entre os diagnósticos”, completou a especialista.

Brasília (DF) 18/02/2025 - Para a psicóloga e psicanalista Sílvia Oliveira avalia, a inclusão da síndrome de Asperger dentro do transtorno do espectro autista é positiva.
Foto: Sílvia Oliveira/Arquivo pessoal
Para a psicóloga e psicanalista Sílvia Oliveira, a inclusão da síndrome de Asperger dentro do transtorno do espectro autista é positiva - Sílvia Oliveira/Arquivo pessoal

Histórias

Leonardo Sampaio tem 22 anos e é estudante de psicologia. Há cerca de um ano, foi diagnosticado como autista nível 1 de e. Como a identificação foi feita recentemente, ele não chegou a ouvir de especialistas a expressão síndrome de Asperger. A suspeita inicial era de transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), mas, ao longo da investigação, outras características apontaram para o TEA.

“O diagnóstico de autismo raramente vem isolado e foi muito importante para entender meus limites e barreiras sociais, além de aprender a lidar melhor com eles", disse.

"O entendimento de muitas questões que antes não faziam sentido sem o diagnóstico foi fundamental. Aprender a lidar consigo mesmo e descobrir que posso ser mais funcional dessa forma melhorou muito minha autoestima”, completou.

Para o jovem, a mudança de nomenclaturas era necessária. “Criava uma espécie de hierarquização e diferenciação dentro do diagnóstico, algo que, não à toa, quando analisamos a raiz do nome, descobrimos que o termo síndrome de Asperger foi uma homenagem a um médico que colaborou com o regime nazista e com a ideia de eugenismo, na busca pela raça perfeita”.

“Acredito que uma síndrome separada fortalecia a crença popular de que o indivíduo com Asperger tem menos prejuízos do que uma pessoa com autismo. Isso atrapalhava reivindicações por ibilidade, pesquisa e direitos. Enxergar o autismo como um espectro é importante para enfatizar que, independentemente do grau de e da pessoa, ela segue com critérios diagnósticos que devem ser respeitados”, avalia.

Ana Karoline Freitas, 21 anos, também foi diagnosticada como autista nível 1 de e, recentemente.

“Meu diagnóstico foi tardio, aos 19 anos, mas mudou minha vida completamente. Eu estava há 2 anos em tratamento psiquiátrico e psicológico, sem conseguir nenhuma melhora efetiva porque os médicos tratavam apenas como depressão e ansiedade.”

Brasília (DF) 18/02/2025 - Ana Karoline Freitas, 21 anos, diagnosticada aos 19 como autista nível 1.
Foto: Ana Karoline Freitas/Arquivo pessoal
Ana Karoline Freitas, 21 anos, também foi diagnosticada como autista nível 1 de e. Foto: Arquivo pessoal

Sobre a mudança na nomenclatura de Asperger para TEA, ela também avalia a decisão como importante.

“Mostra que nós, autistas, somos diferentes, mas continuamos autistas. A distinção, seja por nome ou por nível de e, faz as pessoas acreditarem que exista alguém mais ou menos autistas. Muitos invalidam adultos autistas por terem um nível de e menor ou por terem sido classificados antes como Asperger”.

“Outra coisa importante é a desvinculação do TEA de uma terminologia problemática, que veio de um médico nazista que acreditava em autistas funcionais, reiterando a ideia de que uma pessoa só é importante se estiver de acordo com padrões impostos de socialização, trabalho e comportamento”, pontuou a jovem.

“Já ouvi muitas vezes que não era autista de verdade, que agora todos são nível 1 de e e que não mereço direitos por ser um pouquinho mais autista que o resto das pessoas”, disse.

* Colaborou Ana Carolina Alli Marques, estagiária sob supervisão de Marcelo Brandão